O DIREITO DE SER
DEIXADO EM PAZ
Responsável por
uniformizar a interpretação da lei federal seguindo os princípios
constitucionais e a defesa do Estado de Direito, o Superior Tribunal de Justiça
(STJ) está sempre aberto à discussão dos temas mais relevantes para a sociedade
brasileira. Este ano, o Tribunal da Cidadania trouxe à tona o debate sobre o
chamado direito ao esquecimento.
O direito ao
esquecimento não é um tema novo na doutrina jurídica, mas entrou em pauta com
mais contundência desde a edição do Enunciado 531 da VI Jornada de Direito
Civil, promovida pelo Conselho da Justiça Federal (CJF). O texto, uma
orientação doutrinária baseada na interpretação do Código Civil , elenca o
direito de ser esquecido entre os direitos da personalidade.
Ao estabelecer que a
tutela da dignidade da pessoa humana na sociedade da informação inclui o direito
ao esquecimento, o Enunciado 531 estabelece que o direito de não ser lembrado
eternamente pelo equívoco pretérito ou por situações constrangedoras ou
vexatórias é uma forma de proteger a dignidade humana.
A tese de que ninguém é
obrigado a conviver para sempre com erros do passado foi assegurada pela Quarta
Turma do STJ no julgamento de dois recursos especiais movidos contra
reportagens exibidas em programa de televisão.
As decisões foram
tomadas no julgamento de dois casos; Chacina
da Candelária e Caso
Aída Curi.
No primeiro caso, a
Turma reconheceu o direito ao esquecimento para um homem inocentado da acusação
de envolvimento na chacina da Candelária e posteriormente retratado pelo
programa Linha Direta, da TV Globo, anos depois de absolvido de todas as
acusações.
Nesse acaso, a Turma
concluiu que houve violação do direito ao esquecimento e manteve sentença da
Justiça fluminense que condenou a emissora ao pagamento de indenização no valor
R$ 50 mil.
O homem foi apontado
como coautor da chacina da Candelária, sequência de homicídios ocorridos em 23
de julho de 1993, no Rio de Janeiro, mas foi absolvido por unanimidade. No
recurso, ele sustentou que recusou pedido de entrevista feito pela TV Globo,
mas mesmo assim o programa veiculado em junho de 2006 citou-o como um dos
envolvidos na chacina, posteriormente absolvido.
No segundo caso, a
mesma Quarta turma negou direito de indenização aos familiares de Aída Curi,
que foi abusada sexualmente e morta em 1958 no Rio de Janeiro. A história desse
crime, um dos mais famosos do noticiário policial brasileiro, foi apresentada
no programa Linha Direta com a divulgação do nome da vítima e de fotos reais, o
que, segundo seus familiares, trouxe a lembrança do crime e todo sofrimento que
o envolve.
Os irmãos da vítima
moveram ação contra a emissora com o objetivo de receber indenização por danos
morais, materiais e à imagem. Por maioria de votos, o STJ entendeu que, nesse
caso, o crime era indissociável do nome da vítima. Isto é, não era possível que
a emissora retratasse essa história omitindo o nome da vítima, a exemplo do que
ocorre com os crimes envolvendo Dorothy Stang e Vladimir Herzog.
Nos autos confirma-se
que, a reportagem só mostrou imagens originais de Aída uma vez, usando sempre
de dramatizações, uma vez que o foco da reportagem foi no crime e não na vítima.
Assim, a Turma decidiu que a divulgação da foto da vítima, mesmo sem
consentimento da família, não configurou abalo moral indenizável.
Esta decisão do STJ
deve servir como égide para muitos casos que acontecem no nosso estado,
especialmente quando se tem policiais midiáticos a assacarem acusações
infundadas contra suas vítimas, sendo seus holofotes desregrados programas de
televisão que se presta a montar cenas e atores fictícios. E é bem sabido neste
estado, por poucos, claro, que nos anos 80 um delegado de Polícia Civil e uma
equipe de televisão montaram cenas nas matas do Aurá, o que levou o jornalista
montador da reportagem aos porões do esquecimento na Imprensa, assim como a
demissão daquele delegado que hoje é dublê em um programa de tevê nos mesmos
moldes de montagem.
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